O encanto da vinha

Na Quinta de São Sebastião, começaram as vindimas. Mais uma vez, o ciclo da vinha repete-se, chegada a hora da grande dádiva desta planta milenar.

A videira é, sem dúvida, uma das plantas mais generosas e celebradas ao longo dos séculos, com mais história e maior tradição, inspiradora de todas as artes e até tema de parábolas bíblicas.

Jesus terá encontrado na vinha a metáfora para representar o “reino dos céus”, aludindo de uma vez aos trabalhadores da vinha e numa outra à videira: “Eu sou a videira e meu Pai é o lavrador. Roda a vara em mim, que não dá fruto, a tira; e limpa toda aquela que dá fruto, para que dê mais fruto. Eu sou a videira, vocês são os ramos.”

Cada cultura conta seu surgimento de uma forma diferente. Os cristãos, baseados no Antigo Testamento, acreditam que foi Noé quem plantou um vinhedo e com ele produziu o primeiro vinho do mundo: “E começou Noé a cultivar a terra e plantou uma vinha.” (Génesis, capítulo 9, versículo 20).

Originária da região do Mediterrâneo até ao sul da Alemanha, a vitis vinifera é cultivada em todas as regiões de clima temperado, fazendo da produção de vinho uma das atividades mais antigas da civilização, desde o período neolítico.

A partir do século XVI, a videira foi-se espalhando por todo o mundo, levada nas caravelas portuguesas e espanholas, da grande gesta dos descobrimentos.

No seu livro Uma Herança, o escritor francês Miguel Bonnefoy dá-nos uma excelente imagem deste amor à vinha:

“A casa da Rua Santo Domingo, em Santiago do Chile, escondida detrás de seus três limoeiros, já abrigou várias gerações da família Lonsonier. Vindo das montanhas francesas do Jura com uma videira num dos bolsos e alguns francos no outro, o patriarca ali se instalou no final do século XIX”.

É com este sentido de herança histórica que a Quinta de São Sebastião se dedica, desde 1755, ano da sua construção, à cultura da vinha e à produção do vinho.

Foi também esta tradição que motivou o seu proprietário, António Parente, a prosseguir neste caminho, criando uma marca – QSS – e alargando horizontes.

Atualmente, a Quinta de São Sebastião conta com uma área plantada e com compra a parceiros locais que atinge os 200 hectares.

O responsável pela vinha da Quinta de São Sebastião é o engenheiro Vítor Duarte, que confessa só suspirar de alívio “quando as uvas entram na adega”.

De facto, a planta necessita de muitos cuidados desde o seu nascimento: adubar e armar para,  dois anos depois, se formar uma vinha. Segue-se a poda, tratamentos de dez em dez dias, mobilização e correção dos solos. Ao terceiro ano, a vinha começa a produzir.

Os perigos que espreitam a vinha são vários: doenças como o míldio, oídio ou cicadela, aliadas às circunstâncias do tempo.

Apesar de tudo, Vítor Duarte está confiante numa boa produção, apesar de “um ano difícil”.

É a altura do enólogo Filipe Sevinate Pinto entrar em campo e fazer a sua “magia”.

Ao longo do ano, o diretor-geral da Multiwines, Francisco Melícias, com uma equipa muito profissional, encarrega-se de dar destino aos vários milhões de litros de vinho produzidos, dos quais, cerca de 90 por cento se destinam à exportação.

A marca QSS está hoje presente em cerca de 40 países, nos cinco continentes.

É este o destino eterno da videira: dar origem ao vinho, “o néctar dos deuses”, produto do campo que, como escreveu o poeta inglês William Cowper, “foi criado por Deus”.

A cidade, essa, foi criada pelo Homem.

1.9.2024